Não é necessário muito esforço para perceber que os homens procuram muito menos os cuidados com a saúde quando comparados às mulheres. Não é comum estarem preocupados com um acompanhamento preventivo, em desenvolverem uma rotina de autocuidado ou darem atenção aos primeiros sintomas de que algo não vai bem, especialmente quando se tratam de questões emocionais.
É comum buscarem se cuidar quando um problema fica crítico, quando os incapacita, ou quando geram um medo das consequências serem irreversíveis; esperam até se depararem com uma situação limite, um beco sem saída.
Mas como é tão raro buscarem cuidados, quando precisam encarar uma questão mais crítica, muitos homens sequer sabem por onde começar a buscar ajuda. Não conseguem conectar o seu mal estar a um problema específico e este problema a um especialista correspondente que possa orientá-los.
Na minha experiência como psicólogo focado no atendimento de homens, noto que pelo menos metade dos contatos que recebo buscando terapia são feitos por mulheres que estão apoiando algum homem nesta busca por cuidados: são esposos, namorados, pais, filhos, amigos. Durante os atendimentos sempre busco entender com eles como se veem diante desta situação de não terem buscado o próprio tratamento, mas outra pessoa – uma mulher – precisou tomar a iniciativa. A ideia é que, além de cuidar da sua queixa principal, possam trazer à consciência esta realidade, de que, mesmo adultos, estão delegando o seu autocuidado a outra pessoa.
Atendendo dezenas de homens todos os meses, mesmo que cada demanda seja única e específica, percebo que existem questões bastante comuns que tem forte relação com a forma como a construção social destes homens se dá. Primeiro, pelo fato de terem uma impressão de que o sofrimento emocional não é coisa de homem: as mulheres podem ficar tristes, magoadas, decepcionadas, os homens não; elas podem sofrer com um coração partido, com uma rejeição, uma traição, eles não; as mulheres podem ter depressão, ansiedade, luto, já o que é possível aos homens é a indignação, a raiva, a negação.
Desde a infância, os homens são muito pouco estimulados a terem contato com as suas emoções. Por serem pressionados a não as demonstrarem, acabam se desconectando delas e, por isso, não as reconhecem quando se manifestam, não conseguem nomeá-las, tampouco têm condições de dialogar e reagir a elas. Não sabendo lidar com estas emoções que afloram o tempo todo, a energia produzida por elas não se dissipa. Não há choro, não há reflexão, não há questionamento. Toda essa energia represada, quando finalmente é liberada, é semelhante a uma erupção vulcânica, barulhenta, com altas temperaturas, destrutiva.
Para alguns homens, as emoções não expressadas vão ser externalizadas pela raiva e violência, impulsos que são socialmente aceitos como uma postura masculina. Para outros, a descompressão virá na forma de compulsões, como sexo, jogos, pornografia, álcool, drogas. Aqui, percebo na prática, a ideia de que toda compulsão denuncia alguma falta; a carência dos afetos é preenchida por algo que traga algum tipo de prazer, que mesmo momentâneo, ameniza este vazio.
O sofrimento, que é algo universal, parece ter sido tomado dos homens por eles mesmos. Não se sentem autorizados a sofrer. Diante de uma dor na alma, justificam que o sofrimento do outro é maior, que a sua perda pessoal não é tão grande assim, que a causa da sua angústia não deveria ser motivo de choro. No final das contas, é como se aos homens coubesse somente encontrar as soluções para os problemas, sem o direito de sofrer diante deles. Nem a morte de uma pessoa querida, nem a impossibilidade de gerar ou criar filhos, nem a incapacidade por uma doença ou acidente, nem a perda de um emprego ou uma aposentadoria de uma carreira longa. Nada parece suficiente para dar aos homens o direito de não estarem realizados, firmes e imponentes diante da sociedade.
É importante que os homens encontrem espaços de escuta e de cuidado que ofereçam mais acolhimento e menos julgamento. O desenvolvimento de um ambiente respeitoso com as emoções, as suas próprias e as dos outros, é um caminho importante para que os homens possam lidar melhor com seus desafios, angústias e lutos, sem a pressão de se acharem menos homens por isso.
Por Vinícius Ribeiro
Graduado em Psicologia pelo Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação (IBMR) / CRP 05/73719.
Formação em Logoterapia pelo IPLogo e em Psicopatologia Fenomenológica pelo instituto Epokhé.
Atuação clínica direcionada para adultos, especialmente homens.
Criador e mediador de grupos terapêuticos para homens.
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